Mosaico 1.
Juanita andava na moda. Vestia-se como as prostitutas do cais do porto, e se relacionava com tipos da Praça Mauá.
Juanita conhecia uma infinidade de indigentes e pessoas de toda a laia. Para ela, era motivo de orgulho saber-se mais conhecida que conhecedora, se assim se pode dizer.
Fato era que Juanita não se enquadrava no tipo de pessoa que nasce para ser célebre. Não era expansiva. Pode-se dizer que era até tímida, inclusive. Não era demasiado bonita ou, como se pode figurar, bem arrumada. Não era inteligente e menos ainda carismática. Era tetuda, como se diz no jargão. Mas sabemos; isso não basta. Lembra-me até que qualquer feita, suas curvas inspiraram um tão qualquer quanto a feita a murmurar impropério. Digo que murmurou, em verdade, para si.
- Tetão da porra.
- Cachaça filho de puta. Respondeu-lhe antes de cuspir.
Juanita era querida, embora, creio eu, não tenha sequer nascido para isso.
Toda a gente a conhecia.
Curioso.
Certa manhã Juanita crusava a Praça do Liceu apressada. Um passo antes de outro; um passo sobre o outro.
Eu a veria e não saberia dizer pra onde corre. Nunca me pareceu ter destino. Parecia sempre vagar.
Mas não vagava.
Juanita trabalhava na repartição. Acredite; na repartição. Como todas as pessoas interessantes e complicadas; pelo menos sob meu ponto de vista.
Juana Mahone era funcionária exemplar. Sequer sorria no horário do expediente. Sequer se pendurava na garrafa térmica como as outras funcionárias.
EXEMPLAR.
Esvaziava seu cesto de lixo.
Conheceu então um rapaz.
Certo. Haveria de conhecer inúmeros. Mas não assim.
Conheceu este rapaz. Trabalhador e honesto, entre aspas. Sim, honesto. Entre aspas.
Cléber. Cléber era Clubber.
Clubber, trabalhador e honesto, entre aspas. Basta.
Quase esqueço. Cléber era também motoboy. Característica meramente irrelevante, salvo pela alcunha que lhe rendera tal ofício.
Chego ao ponto onde me lembra o motivo por qual principiei tal narração.
Juanita não era uma pessoa sem eira nem beira, era bem nascida. Frequentara excelente escola em sua juventude.
Este narrador, embora não tão bem nascido quanto Juana, teve a oportunidade de frequentar boas escolas também. Não se impaciente, leitor, tudo se conecta.
Dividimos a mesma classe por anos e anos. E anos e mais anos. E o narrador, na época, pueril, nutria por Juana um sentimento de admiração. Venereva, claro que tão profundamente como é permitido aos jovens, as virtudes daquela garota. Juana se fazia distante e sempre superior.
Triste até.
Ficou em minha memória, destes tempos, não muito mais que uma declaração que Juanita insistia em afirmar. Creio que era como um mote. Mesmo um slogan.
- Só me caso na Igreja de Nossa Senhora da Graça. Em nenhuma outra me caso eu. Caso-me lá e somente lá. E meu marido será o homem que me puder encontrar naquele altar.
Ontem, soube eu que Juanita não morava mais na cidade; havia fugido na madrugada.
Fugira com Cléber.
Cléber, o Motoboy da Rôla Doce.
Honesto, entre aspas, pra caralho.
O altar espera vazio.
Felicidades ao noivo e a noiva deseja este narrador, entre risadinhas sufocadas.